Temos vindo a falar de traumas infantis, mas precisamos falar de um outro termo que é o stress tóxico. Muitos têm sido os estudos que têm surgido em torno desta situação e este artigo pretende explicar o que é e suas consequências.
O stress tóxico surge quando a criança é exposta a determinados abusos, pressões, gritos, ou mesmo ausências de respostas (negligência). O que acontece no stress tóxico é uma ativação prolongada do corpo, que aumenta os níveis de cortisol (a hormona que regula o stress), como resposta do sistema de stress, que pode gerar, consequentemente, prejuízos neurobiológicos e psicológicos. O cortisol está relacionado a áreas específicas do sistema nervoso central responsáveis pela memória, emoção, e o sistema imunológico. As alterações nos níveis de cortisol acarretam problemas nas áreas correspondentes ao desenvolvimento da criança e persiste até à idade adulta. Isto explica como determinadas doenças crónicas surgem, pois provém de exposição a stress tóxico na infância.
Quando esta situação de stress tóxico ocorre na primeira infância, acarreta consequências mais sérias, tais como, dificuldades no relacionamento interpessoal, na aprendizagem, irritabilidade, agressividade, problemas cardíacos, obesidade, delinquência, depressão, problemas com drogas, entre outros. De acordo com o Dr. Charles Nelson, neurocientista norte-americano, coordenador do Programa de Intervenção Precoce de Bucareste, crianças que foram expostas a stress tóxico, desde cedo, quando adultas têm menos tolerância a situações de stress, o que significa que o cortisol está num nível abaixo do esperado, devido à constante ativação na infância. E, portanto, em adultos acabam por não reagir bem em ambiente de stress, tendo uma resposta inadequada.
A pediatra Dra. Heather Forkey, teve grande impacto nesta área do trauma e do stress tóxico. Nos anos 90, ela percebeu, através do seu trabalho em casas de adopção, que as crianças tinham diagnósticos iguais “hiperatividade e défice de atenção”, “perturbação de oposição desafiante” e “perturbação bipolar” e, segundo ela, não fazia sentido todas as crianças terem essas perturbações. Assim que, a comunidade médica começou a compreender melhor como o corpo e o cérebro são afetados pelos traumas, então tudo se tornou mais claro.
Alguns estudos da época, sobretudo um, em 1998, sobre os efeitos das experiências traumáticas na infância, demonstraram que as crianças expostas a traumas (ex. abuso, negligência) têm repercussões na sua saúde e bem-estar, que pode durar até a adultez. Desde então, a comunidade médica mudou a forma como via a resposta do corpo ao trauma e ao stress tóxico, “Agora nós vemos as coisas através de uma lente de eco-bio-desenvolvimento”.
Num documentário, muito interessante, realizado em 2016, “The begining of life” é explicado que os dois primeiros anos de vida são o período critico de aprendizagem cognitiva e emocional. Nesse documentário referem que para o recém-nascido a sensação de fome é uma ameaça à vida, logo dispara o alarme que é o choro. Se o bebé for atendido na sua necessidade, ele vai ter uma memória de satisfação, caso contrário, com o aumento do cortisol pode ficar irritadiço, apático, perder peso e sinapses cerebrais. O Dr. Jack Shonkoff, nesse documentário, refere que esses riscos do aumento dos níveis de cortisol, não tem a ver com um dia mau de vez em quando, mas com a continuidade no tempo, durante vários dias, meses, anos, onde as respostas às suas necessidades, são poucas vezes atendidas.
Percebemos que, um ambiente familiar calmo, acolhedor, onde as necessidades do bebé são garantidas diminui as ansiedades, depressões, problemas psíquicos, sendo promotor de boas aprendizagens escolares e, no futuro, um bom ambiente profissional e familiar. Isto já dizia Bowlby, com a teoria do Apego, que os vínculos afetivos entre o bebé e a mãe são o motor de todo o desenvolvimento físico, biológico, emocional, cognitivo e social do bebé.
O Dr. James Heckman, prémio nobel da economia em 2000, provou matematicamente que investir numa criança rende mais que a Bolsa, ao avaliar os retornos para a sociedade, quando adulto.
Concluímos como é importante manter uma rotina tranquila, segura e amorosa para as crianças e, como isso, traz benefícios para toda a família, para a sociedade e, sobretudo para a criança, a longo prazo.
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