“Aquele que não ama não conhece a Deus, porque Deus é Amor.” 1 João 4, 8
João Cidade (João de Deus) nasceu no dia 8 de Março de 1495, em Montemor-o-Novo, Alentejo.
Aos oito anos, João deixou a sua terra e a sua família para seguir um padre que passara de visita, atraído pelas aventuras que o poderiam esperar. Foram vivendo da ajuda popular de aldeia em aldeia, chegando até Oropesa, em Espanha. Aí, João adoeceu e já não pode prosseguir a viagem.
Ficou a morar com uma família de pastores até aos vinte e sete anos. Depois, João alistou-se no exército espanhol. Participou, pelo menos, em duas grandes batalhas, Viena e Pavia invadidas pelos Turcos.
Como soldado, era tudo menos modelo de santidade: participava nas bebedeiras, no jogo e nas pilhagens. Um dia, caiu de um cavalo roubado perto das linhas francesas. Com medo de ser preso ou morto, fez uma profunda revisão de vida e um voto impulsivo de mudança.
Quando regressou, manteve o voto feito: confessou-se e mudou a sua vida de forma radical e imediata. Os seus camaradas de armas não se preocupavam muito com o seu arrependimento mas detestavam que ele os quisesse fazer mudar de vida também, convencendo-os a deixarem os seus prazeres.
Conhecendo-o bem, os seus companheiros usavam da sua própria natureza impulsiva para o enganarem, fazendo com que ele deixasse o seu posto, com o pretexto de ajudar alguém em necessidade. Por este motivo, o seu lugar no exército ficou completamente comprometido. Foi salvo da forca, no último instante, e expulso do exército, depois de espancado e despido. Mendigou no caminho de regresso à casa onde tinha trabalhado como pastor, até que ouviu falar de uma nova guerra com os Muçulmanos, que invadiam a Europa. Mais uma vez, movido pelo seu caráter impulsivo, partiu de novo, mas no final da guerra, intentou encontrar os seus pais: com pesar descobriu que ambos tinham morrido durante a sua ausência.
Enquanto foi pastor teve muito tempo para meditar e discernir sobre o que Deus quereria da sua vida. Então, depois de tantas peripécias decidiu, aos trinta e oito anos, ir para África para resgatar cristãos cativos. E, novamente, num impulso ponderado, deixou tudo e foi para Gibraltar. Quando estava na doca à espera do seu navio, encontrou uma família nobre que partia para o exílio em África devido a intrigas políticas. Compadecido, abandonou o seu plano inicial e tornou-se como seu servo. Ao chegar ao exílio, a família adoeceu e João não a abandonou. Para prover a alimentação e os cuidados básicos de todos dedicou-se à construção de fortificações. Este trabalho era desumano, sendo os trabalhadores espancados e maltratados. Neste meio tempo, João viu a sua fé abalada. Aconselhado por um padre a não acusar a Igreja pelos atos de alguns dos cristãos, regressou a Espanha não sem antes ter a certeza que a família que cuidara recebera o perdão.
Quando regressou a Espanha, passou os seus dias a carregar navios e as noites a visitar igrejas e a ler livros de espiritualidade. Esta leitura deu-lhe tanto prazer, que decidiu partilhar essa alegria com os outros, por isso, mais uma vez, deixou o seu trabalho nos navios e tornou-se vendedor de livros, viajando de vila em vila . Posteriormente, estabeleceu-se em Granada como livreiro.
Depois de escutar um sermão do místico João de Ávila sobre o arrependimento, fez uma nova revisão de vida, ficando tão perturbado pela tomada de consciência dos seus pecados, que toda a vila foi levada a pensar que o pequeno livreiro tinha enlouquecido. Os amigos, perante as suas atitudes extremas levaram-no para o Hospital Real, onde foi internado com os lunáticos. Recebeu o tratamento normal daquela época – amarrado e açoitado diariamente. João de Ávila, ao tomar conhecimento da situação, veio visitá-lo, dizendo-lhe que a sua penitência já durava há tempo suficiente (quarenta dias).
Perante o sofrimento humano com o qual João de Deus lida todos os dias, não consegue ficar indiferente. Toma então a decisão de fundar o seu próprio hospital, onde os doentes mentais possam ser tratados com dignidade e respeito. Compromete-se, diante do Bispo, a viver pelos que sofrem e a acolher aqueles que quisessem fazer o mesmo.
Como não tinha meios económicos para criar um hospital, nem forma de arranjar dinheiro, dedicou-se a vender lenha na praça, durante o dia e durante a noite percorria as ruas de Granada ajudando todos os que encontrava. Pode dizer-se que esse foi o seu primeiro hospital.
Quando consegue juntar algum dinheiro, aluga um espaço e ele próprio carrega sobre os seus ombros, os doentes que encontra pelas ruas. Sem mobílias, sem comida, sem dinheiro, percorre as ruas mendigando e dizendo “Façam o bem, irmãos!” Aceita tudo o que lhe dão.
Muitos são os episódios que se podiam contar, desde o roubo de uma panela de comida para dar a uns famintos, até ao incêndio no Hospital Real. Perante o fogo que consome o Hospital, o sofrimento dos que estão lá dentro e a inércia de todos os que veem impavidamente, reage impulsivamente e lança-se para o edifício em chamas salvando todos e tudo o que pode.
Com mais dois confrades, em 1540, funda o primeiro núcleo da Congregação dos Irmãos da Misericórdia.
No dia em que fazia cinquenta e cinco anos, enquanto rezava de joelhos e apertava ao peito um crucifixo, morreu vítima de uma pneumonia que apanhou ao tentar salvar um dos seus companheiros que caiu ao rio.
Ele não deixou nenhuma Regra escrita, mas a sua obra de caridade já estava bem encaminhada e seus coirmãos continuavam a Obra, inspirados por ele. Quarenta e cinco anos mais tarde, os seus ensinamentos foram codificados na Regra que daria origem à nova Ordem hospitaleira de São João de Deus: “Fatebenefratelli”.
São João de Deus foi canonizado em 1609 e proclamado Padroeiro dos enfermos e dos hospitais.
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