Na semana passada vimos como o meu corpo revela Deus (a minha feminilidade e masculinidade são a essência da criação) e a importância de Deus nos ter criado do Amor para o amor, ou seja, a gratuidade e amor da Criação. Hoje vamos abordar a questão de sermos Dom um para o outro.
Na teologia do Corpo, o Papa João Paulo II(1) refere que só o amor pode, na realidade, gerar algo bom e, nesse sentido, a criação não é só passar do nada à existência, mas um dom basilar e radical de amor e bondade e é, exatamente, este amor gratuito e radical que proporciona a liberdade ao ser humano, perante Deus e perante si. O amor só o é, na medida em que é livre, caso contrário já não é amor.
Quando o Papa refere que o outro é um Dom para mim, quer dizer que há uma doação livre e total ao outro, existindo, para isso, o domínio de mim mesmo (autodomínio). Que é indispensável para que o homem possa conseguir “dar-se a si mesmo”, para que ele possa tornar-se dom, para que ele consiga encontrar-se plenamente num dom sincero de si. Só uma pessoa livre e com domínio de si é que consegue receber o dom de Deus (o amor) e viver numa total reciprocidade.
“O Senhor é a fonte da comum humanidade deles (Adão e Eva), o Criador de seus corpos e da capacidade que possuem de doar vida. Unindo-se no amor conjugal, unem-se à mesma força criadora de Seu amor. Assim podemos dizer que o amor é fecundo, pois afunda no próprio Deus as suas raízes” (Granados, p.97).
A masculinidade e a feminilidade são em si um dom para o outro, devido à sua complementaridade.
Em toda a história da criação Deus refere a complementaridade do homem e da mulher e, em momento algum, menciona que um é mais importante que o outro. Mesmo quando Deus criou um “auxiliar semelhante”, não se fala de domínio do homem sobre a mulher, mas ela é chamada de companheira, ajudante. Antes da queda, dá-se a entender que a vida do primeiro casal humano era como uma comunidade de amor, em perfeita harmonia, sem o desejo desordenado pelo outro. Depois da queda o homem é chamado perante Deus e culpa a mulher, surge aqui a primeira divisão entre eles. Tudo mudou e são expulsos do paraíso. Contudo, assim como a tentação se aproximou primeiramente da mulher, assim a mensagem da redenção de Deus chega em primeiro lugar a uma mulher.
A relação entre homem e mulher é tratada de forma mais detalhada na carta aos efésios “Mulheres sejam submissas aos vossos maridos, como ao Senhor; … Maridos amai as vossas esposas como Cristo amou a Igreja e se entregou por ela … assim também os maridos devem amar as suas esposas, como aos seus corpos” (Ef 5, 22-28). Com estas palavras, percebemos o verdadeiro amor esponsal, onde a mulher confia no seu esposo e permanece “sob missão”, isto é, na mesma missão com ele, onde deixa que ele oriente, pense, reze, crie uma estratégia e dê a vida pela sua família (foi assim que Cristo amou a Igreja, deu a Sua vida por ela).
A mulher tem em si o dom de amar, cuidar, educar, já o homem tem em si o dom para proteger e sustentar.
Portanto o intelecto feminino busca o ser das coisas com intuição; compreender, sentir, perdoar, simpatizar; biologicamente feita para ser mãe e psicologicamente para ser materna; põe no centro dos pensamentos e da própria vida, amar e ser amada; maior benevolência social, mais interessadas em relações humanas e muito menos agressivas. Em contrapartida, o intelecto masculino gira em torno do pensamento abstrato e científico; foi feito para a organização, a técnica, para vencer as resistências e os obstáculos; para proteger e garantir a existência da mulher e da criança; mais atraídos pelos estudos e atividades relativas às causalidades físicas (trabalho, técnica) e são mais agressivos.
Poder-se-ia dizer que hoje a mulher autêntica é uma espécie em vias de extinção, mas que onde ela se conserva, é a ponte entre os homens que a rodeiam e Deus.
(1) Pereira, M. (Ed.). (2013). Teologia do Corpo: o amor humano no plano divino. Lisboa: Aletheia Editores.
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