No dia de finados é preciso refletir.
No 2 de novembro celebramos o Dia de Finados. Um dia no qual muitos de nós vamos ao cemitério, rezamos pelos fiéis defuntos e pelos nossos entes queridos que já se foram. Mas, para mim, esse dia, bem como todas as vezes em que participo em alguma celebração de exéquias, de algum velório ou enterro, é um momento propício para refletir não somente na morte, mas na vida através da morte. Pois a vida que levamos dirá sobre a morte que teremos.
A doutora da Igreja, Santa Teresa de Lisieux, mais conhecida como Santa Teresinha do Menino Jesus, explica que a morte é o fim de todo ser humano e que, por isso, precisamos tomar cuidado com a vida que levamos. “Os amigos que tínhamos eram muito dados ao mundo, e usavam suas tretas para conciliar, demasiadamente, as alegrias da terra com o serviço de Deus. Não pensavam bastante na morte e, no entanto, veio a morte visitar grande número de pessoas minhas conhecidas, jovens, ricas e ditosas!” (História de uma alma, pag. 87-88).
Somos tentados, a todo o instante, a acreditar que a nossa vida se resume a conquistas de riquezas, fama e poder aqui na terra. Ou que podemos conciliar uma vida de serviço a Deus e a busca das riquezas terrenas.
Santa Teresinha continua na sua reflexão a afirmar: “E vejo que debaixo do sol tudo é vaidade e aflição de espírito […] que o único bem consiste em amar a Deus de todo coração e ser pobre de espírito aqui na terra […]
Pobre em espírito é uma referência ao Sermão da Montanha no qual Jesus declara felizes os pobres de espírito. Para alguns biblistas essa referência ao termo pobre, no grego ptchoi, refere-se ao hebraico anawim, que significa literalmente os pobres de bens materiais. Quanto ao complemento em espírito, alguns entendem como algo interior, ou seja, que pobre em espírito quer dizer que a pessoa pode buscar as riquezas, desde que, tenha um coração bondoso. Mas eu prefiro entender que pobres em espírito está mais ligado a uma livre opção por uma vida simples e modesta de acordo com a vida e a pregação de Jesus.
Digo isto porque o Evangelho de São Mateus apresenta claramente um projeto de vida: o projeto do Reino dos Céus. A pobreza de espírito diz respeito a colocar as posses em seu devido lugar e em não fazer da riqueza um projeto de vida. A concepção desse Evangelho [São Mateus] é a de opor o projeto de riqueza ao projeto do Reino dos Céus. Ambos os projetos são opostos, pois tanto um quanto o outro ocupam todas as dimensões da vida e não se pode investir a vida em duas propostas distintas.
Mas, mesmo no projeto do Reino dos Céus, apresentado no Evangelho de Mateus, os bens materiais não são negados, mas utilizados com equilíbrio – na partilha, comunhão e ajuda mútua. Todos esses fatores, além de garantirem a subsistência, são importantes para a construção do Reino dos Céus aqui na terra.
Assim, como Santa Teresinha nos ensina, precisamos amar a Deus de todo o coração, e a partir daí, pensar sobre qual é o nosso projeto de vida. Projetamos a nossa vida para o Reino dos Céus ou estamos a projetá-la para alcançar as riquezas aqui na terra? Pensemos mais na nossa morte e em como vale a pena viver e morrer. O nosso projeto de vida precisa ser o Reino dos Céus, pois assim, vivendo o céu aqui na terra, continuaremos a nossa vida, ressuscitados com Jesus, no Reino de Deus nos Céus, pois somente o Cristo tem o poder de vencer a morte! Aleluia!
Denis Duarte
Especialista em Bíblia e Cientista da Religião. Professor universitário, pesquisador e escritor
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