A compulsão por compras pode ser uma doença psíquica
Em certas épocas do ano, somos inclinados a gastar mais do que normalmente gastamos. A mídia, o comércio e a nossa remuneração nos levam a esse gasto. Com isso, é aquele entre e sai de loja de sapato, roupa, perfumaria, acessórios e até supermercados, sempre com uma sacolinha. Alguns até com o discurso de que estão comprando, “porque merecem”, porque trabalham o ano inteiro; outras que se escondem e falam que não estavam podendo comprar, mas precisavam de uma roupa nova. A discussão que levanto hoje é: será que a compulsão por compras é uma doença? Falta de vergonha na cara? Falta de planejamento orçamentário? Vamos discutir essa temática.
Entenda o transtorno de comprar
O transtorno de comprar está inserido no DSM-5 (manual diagnóstico e estatístico), no grupo dos transtornos de controle dos impulsos. A compulsão por compras traz uma associação em cadeia, até que seja estabelecida como patologia. Inicialmente, a pessoa precisa ter o start, e quem tem essa função é o ato impulsivo, o desejo impetuoso de comprar, de obedecer seus pensamentos obsessivos que geram angústia e desconforto, até que a voz de comando seja obedecida, neste caso, o ato da compra, pois a pessoa só pensa em comprar o tempo todo.
O pensamento intrusivo surge sem que haja o desejo e aprovação da pessoa e invade a nossa mente. Não conseguindo desviá-lo, a pessoa acaba se entregando ao ato compulsivo para obter o alívio, o que gera um sentimento de culpa, sofrimento e arrependimento, por saber que cedeu a seu pensamento e que não poderia ter comprado, mas que não é suficiente para inibir a próxima compulsão.
Ao responder esse pensamento (obsessivo) intrusivo, são liberados, imediatamente, neurotransmissores (cérebro), que produzem a sensação de prazer e alívio. Fechando esse ciclo, ele se repete constantemente pela necessidade de responder essa voz, que são os pensamentos intrusivos, configurando-se em um ato compulsivo. Podemos notar então que se trata de uma patologia, que não é tão simples e exige uma intervenção em três áreas disfuncionais diferentes: impulsividade, obsessão e compulsão.
O ato de comprar se dá pelo desejo
Podemos compreender que a compulsão é o um comportamento repetitivo e incontrolável, mal adaptativo, que podemos adquirir de qualquer coisa, seja por comida, drogas, álcool, sexo, cigarro, trabalho, atividade física ou compras. Nesse caso, o ato de comprar se dá pelo desejo e não pela necessidade.
Para quem tem compulsão por compras, ir aos centros de compras em época de liquidação e datas comemorativas é um grande perigo. É preciso fugir do perigo, pois o fato de saber que está em promoção, independente do quanto de desconto aquela loja oferece, já é um grande atrativo para o compulsivo. Quantos não exageraram na Black Friday? Consumiram muito mais pela força da propaganda do que pela necessidade do produto. E os exageros das festas de fim de ano? Roupas e brinquedos caros que enchem os olhos e realizam sonhos no Natal!
A disposição das mercadorias nas vitrines, as cores, os produtos… todas as coisas são apresentadas de forma a atrair o olhar do consumidor. No entanto, existe uma parcela da população que é atraída com maior facilidade, por terem esse transtorno consciente ou inconscientemente. É preciso ter consciência daquilo que você é, das suas limitações, para que possa lutar contra elas de forma adequada e com um poder de força maior por conhecer meu “inimigo”.
Qual é a causa dessa compulsão?
Infelizmente, não é como uma receita de bolo, que tem seus ingredientes e preparo bem descritos. Na psicologia, é preciso sempre averiguar a história da pessoa, pois pode ser que a raiz do problema seja fruto de um processo traumático vivido em uma determinada etapa da vida, que hoje, na vida adulta, apresenta-se desta forma. Essa resposta é um mecanismo de defesa adquirido por consequência de um quadro de vulnerabilidade emocional, ansiedade, sentimento de perda ou até mesmo um comportamento aprendido, que é acionado quando se sente ameaçado. Esse comportamento, normalmente, vem associado também a um transtorno de humor; no caso, depressão, ansiedade e fobia podem estar associados ou não. Inicialmente, o que se deve fazer é fugir da ocasião que o leva à compulsão, é entrar nas lojas apenas se verdadeiramente houver necessidade de compra e aprender a responder seus pensamentos intrusivos, para domá-los.
As respostas precisam ser coerentes e reais, para ser capaz de modificar o pensamento – o que não é fácil –, pois ele é imaginário e potente. Pode ser que sozinho você não consiga resistir e responder a seus pensamentos, por isso, o ideal é procurar ajuda psicológica para que um profissional o auxilie a vencer essa limitação.
O ato de comprar pode sim gerar prazer. A questão está em alimentá-lo com grande frequência, tendo por vezes comportamento impulsivo, caindo em um ciclo vicioso, e que a pessoa perde o controle. Diante desse cenário e vivendo tempos de crise, lanço uma pergunta: Estou podendo consumir o tanto quanto tenho costume? Ou será que não estou conseguindo controlar meus impulsos e acabo comprando um pouco mais do que deveria e poderia?
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