O ser humano, segundo Edmund Husserl e Edith Stein, é formado a partir de três dimensões: corpo, psique e espírito.
Corpo, onde há uma ligação com a psique, e, portanto, somos um “corpo vivente”, possuímos matéria e psique. Pensamos sobre nós mesmos, o que sentimos, o que nos acontece.
O que diferencia o ser humano dos animais é a sua atividade espiritual, que lhe permite ter acesso a si mesmo e tornar-se livre para decidir autonomamente. É no espírito, segundo Stein, que se encontra a “alma da alma”, que é a sua força espiritual, motivação, liberdade, noção de bem e verdade. A pessoa livre e espiritual é a que tem certo domínio de si e possui uma espiritualidade pessoal, esta significa vigilância e abertura.
Desta forma, não podemos conceber-nos separadamente, isto é, o ser humano não é a soma de um corpo, com uma psique e um espírito, mas a totalidade das três dimensões intercaladas e unidas entre si. Desta forma, se uma parte está doente reflete nas outras e nem sempre o sintoma que é visível nos indica o problema. Na realidade a dimensão espiritual é muito mais complexa e importante do que o valor que lhe atribuímos, pois quando há uma distorção da noção de bem e verdade, há um conflito da minha essência com a realidade que se me apresenta e entro numa crise, que me pode levar a adoecer.
A antropologia cristã diz-nos que o Homem foi criado por Deus à Sua imagem e semelhança e é distinto dos animais porque tem o “sopro da vida” que foi insuflado no seu corpo (Gn 2,7). Adão, ao contrário dos animais, é convidado a entrar numa “aliança de amor” com o próprio Deus. Ao saborear este amor (com Deus) ele anseia, igualmente, com todo o seu ser, poder partilhar esse amor (aliança) com outra pessoa igual a ele. Por isso “não é bom que o homem esteja só” (Gn 2, 18). Foi na experiência de solidão que Adão descobriu a sua dupla vocação: amar a Deus e amar o próximo (Mc 12, 29-31), bem como a liberdade para negar essa vocação.
Entretanto, a criação da mulher, a partir do osso de Adão, é uma forma figurativa de exprimir que tanto homem, como mulher, partilham a mesma humanidade, portanto um não é melhor que outro, nem um completa o que falta no outro, mas são em si mesmos uma complementaridade. O Homem precisa saber quem é, conhecer-se para se aceitar e dominar as suas paixões.
Para refletir sobre a Pessoa humana é necessário entrar em oração, pois se Deus nos criou, só Ele nos pode revelar quem somos. Trazemos inscrito na nossa alma a Sua marca, o selo do Seu Amor, somos pertença Dele e precisamos cultivar e alimentar a nossa alma. Muitas doenças psicológicas, como referi, têm um fundo espiritual, isto é, são consequência do afastamento de Deus, transportam ausência do Criador, logo são vazias de “força espiritual, liberdade, motivação, noção de bem e verdade”, como referi em cima. Estas almas acabam por procurar preencher esse vazio de outras formas, mas que não satisfazem, por mais que se procure distorcer a realidade e tentar à força, que ela se submeta às minhas ideias, vontades e prazeres, não dá! A realidade não muda com a ausência de Deus em mim.
Concluindo, o Homem percebe que foi criado do Amor, com amor e para o Amor e só com esta visão o Homem se sente realizado e consegue encontrar o sentido da sua vida. Quando me vejo e aceito como filha de Deus, então aceito, da mesma forma, que sou amada por Ele e é esse amor que me fortalece e me redime, por isso nada me perturba e nada me impede de ser filha amada por Deus, porque creio na Sua infinita Misericórdia.
Da mesma forma creio que a minha vida verdadeira não é aqui, não é esta terrena, mas a que há-de vir e que aguardo, ansiosamente. Por isso sou livre e desprendida deste mundo, porque não lhe pertenço, nem ele a mim. A minha alma anseia o repouso no Amor Eterno e os meus olhos estão voltados para lá e é isso que me move aqui.
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