Conciliando a vida de oração e os filhos
Um dia, após ter tido meu primeiro filho, fui com o coração apertado conversar com um padre amigo meu, porque estava me sentindo distante de Deus, já que, em meio a mamadas, banhos, trocas de fralda, roupinhas para lavar, serviços de casa e marido, não estava encontrando tempo para rezar. Dentre tantas coisas que ele me falou, a que mais ficou gravada foi: “Um filho nunca vem para afastar seus pais de Deus, mas para os aproximar”.
Fiquei com aquela frase e fui conduzindo minha vida. O tempo foi passando e eu continuava tentando adaptar as várias realidades do dia com minha espiritualidade. Vivi momentos de aridez, de dias sem rezar o terço, de semanas sem um estudo da Palavra de verdade; às vezes, uma passada de olho, e acabava dormindo com a caneta na mão, rabiscando coisas ilegíveis no papel. Sei que nesse tempo fui amparada pela Eucaristia diária. Em meio a toda correria, não deixávamos de participar da Santa Missa um dia sequer. Isso foi meu sustento. Hoje, graças a Deus, vivo um tempo bonito de intimidade com Deus, de me sentir amada e perceber que meu amor por Ele também cresce a cada dia. Como consegui isso com tantas atribuições e tarefas a serem realizadas? É o que quero partilhar com você.
Vivendo a oração
A primeira e preciosíssima coisa foi entender a beleza de meu chamado e a virtude a que sou convidada a viver como esposa e mãe. Deus espera virtudes diferentes de cada vocação, de cada estado de vida: a dos esposos é o amor e a fidelidade um para com o outro. A das mães e pais é a virtude da paciência e o cuidado com os filhos. Missões diferentes do que Ele espera de um sacerdote e de uma freira, por exemplo. Compreendendo isso, descobri que eu poderia causar tanta alegria ao coração de Deus enquanto varria minha casa, quanto se passasse 40 minutos de joelhos em oração. Não é que Deus não queira me ver diante d’Ele rezando, mas é que, enquanto mãe, minha obrigação primeira é amar e cuidar dos meus; e ao fazer isso, estarei amando e honrando Nosso Senhor. Isso é oração.
A segunda coisa que aprendi com Santa Terezinha, que com certeza aprendeu de seus pais São Luís e Santa Zélia (casados, pais de nove filhos), é que a menor e mais simples atitude feita com amor é oração, é um degrau que sobe em direção ao céu. Isso me ajudou muito: passei a fazer do estender roupas no varal, do lavar louças, do arrumar as camas, de um momento de atividade com os meninos, do receber meu esposo em casa com um beijo, minha oração. Consegui isso todos os dias e com perfeição? Não. Ainda não. Às vezes, o cansaço, a irritação, as preocupações me atrapalham em meu propósito, mas continuo nessa busca; e quando consigo, é para mim um dia pleno da presença de Deus.
Espiritualidade no casamento
A terceira coisa é aprender a fazer tudo na presença de Deus. Desde o acordar, já podemos ir nos colocando em oração, agradecendo a Deus pelo dia e consagrando a Ele todas as nossas atividades. Recordo-me de um dia, um domingo de manhã, que acordei já muito cansada, porque estava sozinha com as crianças desde sexta-feira, pois meu esposo havia viajado em missão para pregar um retiro.
Percebendo logo de manhã, pela impaciência com os meninos, que meu dia não seria fácil, coloquei-me num cantinho da cozinha e comecei a orar em línguas, clamando que o Espírito Santo viesse me ajudar naquele dia, que viesse mudar meu humor e nos ajudasse a ter um dia agradável. Eu não queria ser conduzida pelos meus sentimentos e por meu cansaço, mas pelo Espírito de Deus. Foi incrível o que o Senhor realizou! Passamos um dia tranquilo, divertimo-nos e fizemos tudo que precisávamos fazer em paz. Quando clamamos a presença e o auxílio de Deus e de Nossa Senhora, eles não nos desamparam. Assim, em tudo que fizermos, podemos ir pedindo, numa oração silenciosa ou não (é até bom que nossos filhos nos escutem rezando), que o Senhor venha estar conosco, que Maria venha nos ensinar a ser mãe, que o Espírito Santo preencha nosso lar de amor e paz. Isso é oração, oração constante, ao ritmo da vida que aprendemos com monsenhor Jonas, fundador da Canção Nova.
São Paulo recomenda: “Orai em todo tempo” (Ef 6,18). Isso nós mães e esposas podemos e devemos fazer: enquanto amamentamos, enquanto tomamos banho, enquanto fazemos almoço, enquanto colocamos a criança para dormir, é estar o tempo todo falando com Deus. Falando de quê? De tudo. Tudo que passa no coração: dores, medos, alegrias, dúvidas, sofrimentos, sonhos. Isso é oração concreta.
Continue sempre rezando
Outro ponto da espiritualidade do casado é entender que o amor entre os esposos é a grande expressão da presença de Deus na família. Estudando a “Teologia do Corpo” de São João Paulo II, compreendi que o ponto forte da espiritualidade do casal acontece no ato conjugal, onde esposo e esposa atualizam o sacramento, tornam-se expressão do amor de Cristo pela Igreja e expressão do próprio Deus, que é comunhão, é unidade. Então, por exemplo, se uma esposa está indecisa sobre como aproveitar seu tempo, se rezando o terço ou unindo-se sexualmente ao seu marido, penso que melhor para o casal – emocional e espiritualmente falando – é a segunda opção; melhor ainda é se puderem os dois recitarem o terço juntos e depois fecharem a espiritualidade do dia com a celebração do amor em seu leito conjugal. Isso é oração, a mais bela oração de um casal.
Por fim, compreendi que tudo na nossa vida passa, só Deus não. As noites em claro vão passar; o cuidado, muitas vezes exaustivo com o recém-nascido, vai passar; as inúmeras trocas de fraldas ou de roupas sujas de papinha, vão passar; as preocupações com provas, tarefas e a escola, vão passar; o trabalho profissional das esposas, que além da casa também trabalham fora, com o tempo vai mudar. Então, o que vivemos hoje são exigências próprias desse tempo, mas futuramente não as teremos e provavelmente voltaremos a ter mais tempo para nos dedicarmos diretamente à oração, às missões e atividades pastorais em nossas comunidades. Conformemo-nos com o chamado de Deus e nos alegremos, fazendo tudo com amor, porque essa é a maior e mais perfeita oração: “Agora pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, mas o maior destes é o Amor” (1 Cor 13,13). Assim, ao nos questionarmos sobre a espiritualidade de uma esposa com a pergunta: “Quando é que ela reza?”, logo teremos a resposta também em forma de pergunta: “Quando é que ela NÃO reza?”.
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