Precisamos de mudar, de nos converter da indiferença à solidariedade, da autossuficiência à humildade e ao serviço fraterno

Nesta vigília de setembro que celebra a quinta aparição de Nossa Senhora aos Pastorinhos, presidiu à Celebração da Palavra o Bispo Emérito de Santarém, D. Manuel Pelino Rodrigues.

Na vigília de oração, no silêncio e na escuridão da noite, procuramos confiantes a luz de Deus que Nossa Senhora nos transmite. Na peregrinação da vida deparamos com muitos momentos de escuridão, de sofrimento, de desânimo, de medo. Nessas ocasiões, recorremos ao amparo da nossa Mãe do Céu para que ela nos envolva com o seu manto de luz. Ela é para nós a aurora que anuncia a luz do Sol Nascente, Jesus Cristo Nosso Senhor, que vem iluminar os que vivem nas trevas. Os muitos títulos com que veneramos a Mãe celeste, manifestam a riqueza variada de graças que, segundo a experiência milenar dos fiéis, esperamos da intercessão da Virgem Imaculada. A sua solicitude materna estende-se aos vários âmbitos da nossa vida, à saúde do corpo e à saúde da alma. É como a água salutar de que falava o profeta Ezequiel na primeira leitura, que tem a virtude de curar tudo o que toca. Na Mãe de Deus, encontramos sempre uma fonte de salvação, uma nascente de graça para a saúde do corpo e da alma. 

Durante o tempo de confinamento da pandemia, o Papa Francisco, na bênção Urbi et Orbe, invocou a ajuda divina para vencer o terrível flagelo do coronavírus, perante o Cristo de São Marcelo e o ícone mariano muito antigo, conhecido por “Salus Populi Romani”. Podemos dizer na nossa língua, Ícone de Nossa Senhora da Saúde, ou da Salvação, ou seja, da saúde global, do corpo e da alma. É a salvação que Jesus comunicou no seu tempo e nos concede hoje, por intercessão de sua Mãe santíssima, a salvação da pessoa na sua vida, no seu mundo e com o seu mundo e na eternidade. Foi realmente a saúde global para a humanidade ferida que o Papa Francisco, nesse momento comovente, suplicou a Deus por intercessão de Cristo e de Sua Mãe. Pediu, realmente, o fim da pandemia, mas também a nossa cura espiritual, a mudança de atitude perante a vida, perante a natureza e perante os outros. Na verdade, procedíamos como se fossemos donos do mundo, autossuficientes, capazes de tudo e afinal a pandemia veio pôr a nu a nossa fragilidade e as falsas seguranças em que assentamos as nossas vidas. “Ninguém se salva sozinho” realçou o Papa Francisco. Para alcançar a salvação, a saúde da alma e do corpo, necessitamos da ajuda de Deus e da solidariedade uns dos outros. Precisamos de mudar, de nos converter da indiferença à solidariedade, da autossuficiência à humildade e ao serviço fraterno. Quando invocamos Nossa Senhora como fonte de salvação é também esta atitude de conversão que lhe devemos manifestar.  

“Quem tem sede venha a Mim e beba. Do coração daquele que acredita em Mim correrão rios de água viva”, ouvimos no evangelho de São João (Jo 7, 37-38). Jesus fez esta afirmação solenemente no templo, no final da festa judaica das colheitas. Revela, assim, que vem dar cumprimento à profecia de Ezequiel sobre a fonte medicinal que nasceria do templo de Deus e daria cura, novo alento e nova vida a todos os seres vivos, em toda a parte onde chegasse. Jesus é essa fonte de água viva que pode saciar a nossa sede de luz e de verdade, de amor e de esperança, de cura espiritual e corporal. Comenta o evangelista São João que Jesus se referia ao Espírito Santo que haviam de receber os que n’Ele acreditassem. Realmente o Espírito Santo é “Senhor e Fonte de vida”, como declaramos no Credo. De vida plena, embelezada pela caridade, pela esperança, pela paz e pela alegria.

Maria de Nazaré, desde a Anunciação, tornou-se íntima colaboradora do Espírito Santo ao conceber por virtude do Espírito a vida nova de Jesus. Recebeu também em primeira mão o dom do Espírito no Pentecostes para comunicar a sua luz e força regeneradora à Igreja e ao mundo. Do seu coração de Mãe brotam, para os que a ela acorrem, rios de água viva. Aprendamos com ela a escutar e a seguir a voz do Espírito no silêncio, na atenção aos sinais dos tempos e na meditação da Palavra de Deus que ressoa nas Sagradas Escrituras. Para que a água viva do Espírito Santo revitalize e fecunde as nossas vidas e com a nossa colaboração possa vencer a aridez e a secura do individualismo e da indiferença e gerar os frutos da vida nova em Cristo, fonte de salvação.