Deolinda Machado incentiva a «uma cadeia de solidariedade» e espera «novos modelos de sociedade» pós-pandemia
Deolinda Machado, do Movimento dos Trabalhadores Cristãos em Lisboa, alerta para as dificuldades de muitos trabalhadores nesta pandemia Covid-19, afirma que “não há necessidade de tanta pobreza, porque a riqueza acumulada é imensa”.
“Alguns exemplos infelizmente têm chegado com testemunhos de grande sofrimento porque, para além do lay-off, há pouco a Ministra da Trabalho referiu mais de um milhão – no início de abril não chegava a meio milhão – há aqueles que, de facto, já estavam nesta situação de pobreza, a pobreza laboral, quase 10%”.
Deolinda Machado observa que, “infelizmente”, todos sofrem com a pandemia de Covid-19, “mas uns mais do que outros”, nomeadamente, os trabalhadores que “já estavam desprotegidos no seu contrato laboral, porque eram precários” ou porque ganhavam salários “quase de miséria ou mesmo de miséria”, pelo que quem não tinha segurança viu “mais rapidamente a sua situação atingida”.
“Chegaram-nos casos de famílias cuja precariedade é imensa e que ficaram, ao contrário da outra crise, de um dia para o outro sem nada. Se não fosse a solidariedade entre amigos, clientes, nalguns setores mesmo a trabalharem por conta própria, estas pessoas não tinham o que comer à mesa, e muitas não terão”, desenvolveu.
A entrevistada, membro da Liga Operária Católica/Movimento dos Trabalhadores Cristãos (LOC/MTC) na Diocese de Lisboa, salienta que é para esta situações que têm de estar voltadas as orientações, lembrando que várias encíclicas papais se referem ao “trabalho digno e à dignidade de todos, à partilha, à igualdade no acesso aos bens sociais”.
“A Doutrina Social da Igreja é bem rica neste aspeto e queremos fortalecê-la. Nesta Páscoa que estamos ainda a viver não queremos que uns avancem e outros fiquem para trás”, afirma.
Neste contexto, para Deolinda Machado espera depois da pandemia uma “globalização da solidariedade e não da indiferença”, como apela o Papa Francisco; caso contrário, a sociedade “vai ter um desfecho que não é humanizante”, por isso, é necessária uma reorganização e pensar “em novos modelos de sociedade”.
Os direitos dos trabalhadores, a criação de condições de vida em sociedade, não têm tido a primazia de muitos governantes”.
Segundo Deolinda Machado, a propagação do novo coronavírus veio colocar em maiores dificuldades o modelo de economia e de trabalho, considerando que em Portugal “é preciso” que a contratação coletiva de trabalho “seja revista e que seja implementada”, com “redução do horário de trabalho” para todos terem trabalho, “mas com salários dignos”.
“A precariedade é a primeira causa de desemprego e o medo apodera-se de quem tinha estas redes de trabalho muito frágeis. Como sociedade, temos de repensar o papel de todos, das organizações, dos parceiros sociais, dos governos, das organizações sociais, a própria Igreja, que tem dado um exemplo desta harmonia que é preciso criar, desta rede que tem sido reforçada”, desenvolveu.
Para a militante da LOC/MTC na Diocese de Lisboa, “é preciso perceber” como os Bancos vão “retribuir o que os contribuintes fizeram por eles”, que “receberam milhares de milhões a fundo perdido”, bem como a União Europeia porque a solidariedade, a partilha, tem que “ser muito maior e todos devem fazer parte dessa mesma mesa”.
Deolinda Machado refere que é preciso “cuidar das pessoas todas” – dos mais novos, dos que estão na vida ativa, dos idosos – e “erradicar a pobreza” porque “é possível” e, “obviamente, organizar o Estado de modo a poder socorrer toda a gente”, sem esquecer o setor privado que “deve dar esse contributo porque pode haver ética nos negócios”.
“Como dizia o professor Bruto da Costa, sempre interveniente nestas lutas de cidadania, e contra as desigualdades: não podemos ser diferentes”, acrescentou, lembrando também Manuela Silva – dois investigadores no domínio da pobreza e antigos presidentes da Comissão Nacional Justiça e Paz da Igreja Católica – e alertou para pecado de haver quem “não paga os impostos”.
Deolinda Machado defende “uma cadeia de solidariedade”, que este tempo ajudará a refletir, a “novas atitudes” para que não se possa alguém a precisar de “ter uma sopa para comer e outros a esbanja-la”, numa “sociedade organizada em torno do lucro, e do lucro e do lucro”, é necessário “uma maior atenção ao outro”.
“Amanhã posso ser eu. Se perder o meu emprego o que é que eu sou amanhã; É preciso perceber que todos temos dificuldades, é claro que se eu não receber não posso pagar, eu percebo isso, mas sabemos que há empresas que têm acumulado lucros que podem partilhar”, apontou.
Fonte: Agência Ecclesia
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