Na mensagem para este tempo de Advento que se vai iniciar, a Conferência Episcopal Portuguesa, reflete sobre o “Bom-Dia” que Deus deseja que aconteça e permaneça nas nossas vidas.
“Advento. Deus vem. Deus vem, Deus saúda, Deus fala, Deus ama, Deus chama, Deus ordena, Deus escuta, Deus responde, Deus envia. Advento. Sujeito Deus. Primeiro Deus. O Deus do Advento, o Deus que Vem traz consigo uma grande carga verbal, que convém que se torne “viral” na nossa vida. Imitação de Deus. Deus que vem para nos dizer “Bom-Dia!”, que é o modo de fazer do Senhor Ressuscitado quando se apresenta no meio de nós, e diz: “Shalôm!”, “A Paz convosco!”.
Esta Saudação, este Shalôm, esta Paz, este “Bom-Dia”, que ressoa desde a Criação, entra em nós, enche-nos de Bondade e de Alegria, e faz-nos encontrar um modo novo de encarar a vida. Esta Saudação, este Shalôm, esta Paz, este “Bom-Dia”, estabelece connosco uma relação nova e boa, não nos transmite uma informação, não tem em vista um negócio, não solicita a nossa reflexão ou decisão. Não nos deixa a pensar, a escolher, a decidir. Apenas a responder. Apeia-nos, portanto, do pedestal do nosso “eu” patronal: eu penso, eu quero, eu decido, eu, eu, eu…, e deixa-nos apenas a responder. Apenas. Como se responder fosse coisa pouca. Responder ao Senhor da nossa vida. Ao “Bom-Dia” responde-se “Bom-Dia”. É a Bondade sete vezes dita na Criação, o Sentido da Criação e da Vida a passar de mão em mão, rosto a rosto, coração a coração. Do coração de Deus para o nosso coração. Dos nossos corações uns para os outros. Avenida ou torrente de Bondade e de Fraternidade. Advento. Deus vem e enche o nosso tempo de “Bom-Dia”!
Quando alguém te diz: “Bom-Dia!”, já sabes então o que isso significa, implica, replica, multiplica. Imagina agora que à beira da estrada encontras um pobre homem caído, abandonado, a esvair-se em sangue. Ao ver-te passar, balbucia para ti, ou apenas acende uma voz dentro de ti, que te diz, mesmo sem o dizer: “Olha para mim”, “olha por mim”, “cuida de mim”. Repara bem que o pobre não te diz: “Se quiseres, podes cuidar de mim”. Se assim fosse, podias pensar e decidir, sem precisares de descer do trono da tua sacrossanta liberdade de escolha. Mas o “cuida de mim” que o pobre balbucia para ti não é opcional: é uma súplica que é um mandamento; não tens opção de escolha; tu é que foste escolhido; tens de responder que sim, debruçando-te sobre o pobre desvalido que ordena e implora o teu auxílio. Repara bem: o pobre que jaz à beira da estrada elege-te e obriga-te, sem te obrigar, a debruçares-te sobre ele. Movimento inaudito: agora que te debruçaste sobre ele, que ordenou e implorou o teu auxílio, podes entender melhor a sua condição de soberano. Ele é, na verdade, o único verdadeiro soberano, pois sem te apontar nenhuma espingarda ou maço de dinheiro, fez com que tu te debruçasses sobre ele, libertando-te dos teus projetos e negócios, horários, agendas, calendários. Os poderosos e tiranos podem e sabem apenas escravizar-te. Mas não podem nem sabem libertar-te!
Por isso, o Deus que vem agora visitar-nos confunde-se com os pequeninos (cf. Mateus 25,40.45), e neles vem amorosamente ao nosso encontro, para conversar connosco, para nos dizer “Bom-Dia”, e ordenar suplicando: “Cuida de mim”. Estava atento Isaías, o profeta do Advento, que ouve Deus a dizer assim: «em lugar alto e santo Eu habito, mas estou também com os oprimidos e humilhados, para dar vida e alento aos que não têm espaço nem sequer para respirar, aos que têm o coração despedaçado» (Isaías 57,15). Bem podia o profeta dizer que Deus desceu à nossa pandemia. E nós, os habitantes da pandemia, bem podemos rever-nos no Salmista que reza: «Do “confinamento” invoquei o Senhor» (Salmo 118,5), chegando-nos a resposta outra vez através de Isaías: «No tempo favorável te respondi; no dia da salvação te socorri» (Isaías 49,8), resposta que Paulo também regista, atualiza e pontualiza: «É agora o tempo favorável! É agora o dia da salvação!» (2 Coríntios 6,2).
O andamento do Advento traz-nos um Deus que vem para o meio de nós e da nossa anemia e pandemia, e diz: “Bom-Dia”, e suplicando ordena: “Cuida de mim”. É terrível termos de assumir que, se não cuidamos bem dos pobres e necessitados, também não cuidamos bem de Deus! Mas é agora o tempo favorável! É agora o dia da salvação! É agora o tempo da enchente da Palavra de Deus, de que não devemos fugir, mas a que nos devemos expor. O nosso “eu” patronal e autorreferencial entrará em crise, e teremos de mudar comportamentos. Acolher e responder deve ser o nosso alimento. O Deus que vem não vem mudar as situações. Vem mudar os corações. E são os nossos corações mudados que podem mudar as situações. O Advento é tempo de mudança e de esperança. Celebrar o Advento é deixar entrar em nós esta torrente de Bondade, esta Saudação, este Shalôm, esta Paz, este “Bom-Dia”, este “Cuida de mim”. E responder “Bom-Dia!”, e responder que “Sim”.
Sim, porque a resposta de Deus hoje somos nós. «Desci a fim de libertar o meu povo da mão dos egípcios…», diz Deus a Moisés, mas pega logo em Moisés pela mão, e diz-lhe: «E agora vai; Eu te envio ao Faraó, e faz sair do Egito o meu povo» (Êxodo 3,8.10). Texto grandioso e emblemático. O Deus do Advento vem para o meio desta pandemia, pega na nossa mão, muda o nosso coração e envia-nos a mudar a situação. Está aberta a oficina do Advento: enquanto uns se afadigam na vacina, outros nos hospitais, outros nos lares, nas farmácias, na padaria, empenhemo-nos todos em encher este mundo de Paz, de Esperança e de “Bom-Dia”, à imagem e sob a proteção maternal de Maria!”
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