O Senhor não força quem quer que seja a segui-lo!
A Igreja presta um serviço às novas gerações quando lhes possibilita, através da vida das Comunidades Cristãs, a resposta aos apelos de Deus, que continuamente convoca a seu serviço e ao serviço dos irmãos. Viver dignamente é identificar o chamado que Deus faz na vida de todos os homens e mulheres, edificando a existência num diálogo continuo com o Senhor, superando o individualismo tão frequente na busca de carreiras e posições na sociedade. No início de um novo ano, vale a pena abrir as perspectivas de vida à nossa juventude, para que a generosidade inscrita em seu coração pelo próprio Deus venha a desabrochar plenamente.
Deus tem a ver conosco. Sua presença em nossa vida não pode ser entendida apenas como aquele que dá o “chute inicial” numa partida esportiva e depois abandona os que dela participam. Trata-se de um maravilhoso mistério o modo como Deus cuida de nós, respeitando profundamente a liberdade com a qual fomos criados e permanecendo, ao mesmo tempo, senhor da história do mundo e de nossa história pessoal. Nossa existência nesta terra é um presente do Criador, uma tarefa a ser desempenhada com dedicação, para ser entregue de coração alegre, quando formos chamados para junto dele. Ali, teremos a alegria de prestar contas da maravilhosa aventura da vida nesta terra, destinada a glorificar o próprio Deus e fazer o bem ao próximo. Esta é, desde já, a nossa realização. Fomos feitos como obra prima e destinados à felicidade nesta terra e na eternidade, já que ninguém foi feito para a perdição!
Para realizar seu plano de amor e conservar o dom da liberdade que nos foi prodigalizado, Deus oferece sinais de seu chamado. O jovem Samuel (Cf. 1 Sm 3, 3-19) passou pelo processo de discernimento que o conduziu a identificar a voz de Deus, no meio de tantos outros apelos, por três, quatro ou milhares de vezes. Quando a Escritura se refere à voz do Senhor que pronuncia o nome do jovem Samuel, não significa necessariamente que serão extraordinárias as intervenções divinas na vida das pessoas.
Um sinal de Deus para Samuel foi a sabedoria do sacerdote Eli que, mesmo enfraquecido pelo peso dos anos, indicou-lhe a resposta adequada frente ao chamado de Deus. É o serviço do conselheiro amadurecido, tão necessário às novas gerações. Outra fonte é a Palavra de Deus, lida, acolhida e praticada, com a qual se estabelece um relacionamento fecundo com Deus. Esta fortalecerá o clima de escuta da voz de Deus. Ela é um inigualável sinal do Senhor para todos os tempos, inclusive o nosso, a fim que nossos adolescentes e jovens não deixem cair por terra nenhum de seus apelos.
Só que Deus não impõe, mas propõe! O Senhor não força quem quer que seja a segui-lo! É uma pena que uma pessoa passe toda a sua existência sem desfrutar a beleza de transformá-la num diálogo fecundo com quem a pensou como obra prima. Efetivamente o Criador, assim “se arriscou”, fazendo o homem e a mulher à sua imagem e semelhança, inteligência e liberdade. A história da humanidade mostra o quanto este drama pode ser terrível e ao mesmo tempo maravilhoso. Em situação normal, chega para todos a hora das decisões. Muitos dos que são hoje adultos sabem identificar, no escrínio de sua consciência, o quando lhes custou e alegrou fazer as escolhas que definiram a família que formaram, ou para outros, o sacerdócio, a vida religiosa, a opção de estudo e profissão, o serviço à comunidade. É a linda aventura da liberdade. Só que as famílias precisam reaprender, no processo educativo dos filhos, a incluir no menu de tarefas a executar na vida a pergunta fundamental que remete ao diálogo com Deus, o que acontecerá na medida em que se respirar em nossas casas um ambiente de oração e de escuta.
Há ainda outro serviço a ser oferecido pelas gerações mais maduras, a saber, a proposta aos jovens de grandes ideais, para que seja superado o terra a terra do quotidiano feito apenas de necessidades primárias, ainda que estas sejam hoje entendidas como os sonhos de consumo que habitam os corações das pessoas. Falta maior radicalidade, visão de futuro, senso do bem comum, enfim, idealismo e admiração por figuras emblemáticas de todos os tempos e de nossos dias.
O jovem Samuel da Bíblia, os discípulos de João Batista que vieram a seguir Jesus, André e João, ou Simão, que veio a se chamar Pedro, quem sabe seu nome seja Filipe ou Natanael, vieram a estar com o Senhor e com ele permaneceram. Sintam-se reconhecidas e valorizadas aqui todas as pessoas de nomes e idades diferentes que já experimentam permanecer com o Senhor durante minutos, horas ou dias, para descobrir que o sentido da vida plena se encontra na comunhão com ele.
De propósito, desejo ainda provocar as gerações adultas que podem ter se esquecido do primeiro amor da descoberta de Jesus Cristo, ou gente que se habituou demais com as coisas de Deus. Limpe-se a poeira ou a ferrugem do tempo, das manias e dos pecados. Comecem uma nova etapa, nestes primeiros dias do ano, quem sabe com uma boa e frutuosa confissão, com a qual se renovem na graça. Não se esqueçam que a chama acesa por Deus em seus corações não é feita para ficar guardada, mas passada adiante. Vejam os jovens nestas gerações mais maduras a beleza dos grandes ideais, dignos da vida da graça que Deus plantou em nossos corações.
Esta é a proposta de uma visão da vida humana e cristã com chave vocacional, na qual a Igreja deseja comprometer a todos. Nas Paróquias e Comunidades, é tempo de oferecer às crianças, adolescentes e jovens as oportunidades de discernimento do chamado de Deus. Se este não existisse, o Senhor teria abandonado seu povo, o que não é verdade. Deus chama sempre, mesmo quando nos parece que sejam raros os seus apelos (Cf. 1 Sm 3, 1). Não falta a voz do Senhor, ainda que possam faltar ouvidos e corações abertos. Como o otimismo da fé nos conduz, cada pessoa adulta, cristão ou cristã que tenha feito uma sincera e consistente experiência do amor de Deus, descubra-se convocado a chamar, em nome do Senhor e da Igreja, as novas gerações para o serviço do anúncio do Evangelho, nas várias vocações e estados de vida.
Enfim, as Comunidades paroquiais se transformem em casas com portas abertas, para dizerem a todos, com sua organização, liturgia e vivência do Evangelho, “Vinde ver” (Cf. Jo 1, 39) a todos os que indagarem pela morada do Senhor! E rezemos: “Senhor da Messe e Pastor do Rebanho, faze ressoar em nossos ouvidos teu forte e suave convite: ‘Vem e segue-me’. Derrama sobre nós o teu Espírito. Que ele nos dê sabedoria para ver o caminho e generosidade para seguir tua voz. Senhor, que a Messe não se perca por falta de Operários. Desperta nossas comunidades para a Missão. Ensina nossa vida a ser serviço. Fortalece os que querem dedicar-se ao Reino na vida consagrada e religiosa. Senhor, que o Rebanho não pereça por falta de Pastores. Sustenta a fidelidade de nossos bispos, padres e ministros. Dá perseverança a nossos seminaristas. Desperta o coração de nossos jovens para o ministério pastoral em tua Igreja. Senhor da Messe e Pastor do Rebanho, chama-nos para o serviço de teu povo. Maria, Mãe da Igreja, modelo dos servidores do Evangelho, ajuda-nos a responder Sim. Amém” (Cf. Oração do Ano Vocacional).
Dom Alberto Taveira foi Reitor do Seminário Provincial Coração Eucarístico de Jesus em Belo Horizonte. Na Arquidiocese de Belo Horizonte foi ainda vigário Episcopal para a Pastoral e Professor de Liturgia na PUC-MG. Em Brasília, assumiu a coordenação do Vicariato Sul da Arquidiocese, além das diversas atividades de Bispo Auxiliar, entre outras. No dia 30 de dezembro de 2009, foi nomeado Arcebispo da Arquidiocese de Belém – PA.
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