Deus criou o corpo para também por ele conduzir o homem à santidade
Todos nós, sem exceção, somos chamados à santidade. Mas, diferentemente dos anjos que são puro espírito, o nosso chamado adquire uma forma muito especial para se manifestar: o nosso corpo. E como filhos de Deus, somos predestinados a participar da íntima relação de amor existente na Santíssima Trindade; faremos parte, no fim dos tempos, do “banquete do Cordeiro” (Ap. 19, 9). Seremos santos, mas essa vocação à santidade já adquire sua concretude aqui, no nosso tempo e espaço.
Em um momento histórico, situado nos primeiros séculos da era cristã, tivemos o surgimento de alguns movimentos que faziam certa oposição entre corpo e alma, afirmando ser a alma um bem que devemos aperfeiçoar e o corpo um mal a ser rejeitado. Os maniqueístas, por exemplo, defendiam essa concepção do homem.
Entretanto, o homem é um ser integral, feito pelas mãos do próprio Deus e com a Sua apreciação, que olha a criatura e diz que “é muito boa” (Gn 1,31). O homem foi feito de material palpável, da terra, do barro… matéria física e concreta. O Senhor soprou nele a vida e, assim, o primeiro homem foi constituído em alma, espírito e corpo! Esse é o homem integral.
Se temos, assim, um chamado à santidade, só poderemos corresponder-lhe por meio do nosso ser integral. E como sabemos que existimos? Como se manifesta nossa alma e espírito? Através do corpo. Nas atividades cotidianas, na forma como olhamos as pessoas ao nosso redor, como lhes entregamos nosso sorriso, nossa ajuda, na maneira como desenvolvemos nossos afazeres, podemos ser sujeitos e canais de santidade.
Certa vez, um garoto perguntou à sua mãe como eles se reconheceriam no céu. “Como saberei que você é você, mamãe?”. Que pergunta brilhante! Não será de outra forma senão pelos olhos do nosso corpo; saberemos quem o outro é pela forma que ele possui, o tocaremos com nossas mãos, abraçaremos com nossos braços.
Porém, em nossos tempos, infelizmente encontramos muitos apelos para profanar a santidade que nossos corpos carregam, desviando-nos da nossa missão fundamental de santidade. O lugar central de Deus é, inúmeras vezes, substituído pelo corpo humano.
Imagens fantasiosas de corpos femininos perfeitos levam muitas mulheres a desenvolverem um parâmetro irreal do que é bom, belo e saudável. O mesmo se dá com os homens, que além de projetarem a imagem de uma mulher que não existe (a mulher com curvas perfeitas divulgada na grande mídia), também fazem de si pequenos deuses em busca da perfeição estética.
No fim das contas, essa sede de perfeição é própria de todo ser humano. Queremos o belo e o perfeito, nossas almas foram feitas para isso! Somos cidadãos do Éden, lugar de perfeita ordem, da beleza infinita de Deus manifestada em toda a criação.
Contudo, nossa cultura inverte completamente o significado mais profundo do corpo. Em vez de levarmos o ser humano a realizar-se plenamente na sua humanidade e, por meio de seu corpo, ser sujeito de santidade, as prioridades são invertidas e não somos mais dom ao outro. Ao contrário, fazemos do corpo um meio para a satisfação, para o prazer pessoal. O outro deixa, assim, de ser sujeito de santidade, passando a ser um objeto.
Entretanto, se temos em nossa humanidade as marcas do pecado original que significou essa ruptura com o perfeito, temos também o “eco da inocência original” (João Paulo II, 1980). Na Teologia do Corpo, o Papa dirá que, através do corpo, a santidade entrou no mundo. Que santa realidade! Que linda ousadia proclamar essa verdade sobre o significado do ser humano!
Podemos, assim, escolher o caminho dessa inocência original que todos temos marcada em nossas almas. A perfeição pode hoje acontecer para mim e para você por meio dos nossos corpos.
As mãos poderão plantar as sementes do Reino que sentimos saudade. Os pés podem ir em direção ao outro e, com um sorriso, convidá-lo para a mesma santidade que desejamos viver. O abraço acolherá a dor, os ouvidos serão território onde outros poderão partilhar suas trilhas, o nariz, as pernas, ombros… tudo é material que constrói a santidade, vocação de todo homem!
Autora: Milena Carbonari – Psicologa, pós graduanda em sexualidade
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