Todos sentimos no nosso coração o desejo de ter uma vida plena: todos queremos ser felizes. Mas como procuramos nós essa felicidade? Em que fontes procuramos nós saciar esta sede que carregamos no nosso coração? Neste artigo procuramos descrever a forma como Carlo Acutis procurou a felicidade na sua vida, e como a encontrou verdadeiramente, ao ponto de ser beatificado (declarado beato, que quer dizer feliz), ou seja, proposto aos católicos como modelo para quem quiser viver a verdadeira felicidade.
A beatificação do Carlo Acutis trouxe uma grande onda de entusiasmo, porque ele é o primeiro santo de uma geração marcada por profundas mudanças sociais e económicas. Com efeito, há acontecimentos marcantes na história da humanidade. Costuma dizer-se que o século XX “fechou” com a queda do Muro de Berlim, em 1989, e o século XXI “começou” com o atentado contra as Torres Gémeas, em 2001. São datas históricas que funcionam como marcos para contar a sucessão dos acontecimentos e balizar épocas e transformações sociais. O período que vai de 1989 a 2001 é um tempo de grande entusiasmo e otimismo político, social e económico. Deu-se a democratização da informática, os horrores do nazismo e do comunismo pareciam totalmente ultrapassados, a economia viveu um tempo de grande crescimento. Quem nasceu e cresceu nesta época vivenciou uma infância de grande otimismo. No entanto, o terrorismo a nível mundial veio encobrir a mente humana com a penumbra do horror e aquele otimismo foi substituído por um pessimismo em relação à segurança pública e aos avanços da tecnologia. Na aldeia global, que se passou a habitar, parecia necessário cada vez mais reforçar as portas e as janelas. É neste contexto que nasce Carlo, a 3 de maio de 1991, em Londres (Inglaterra), onde os pais se encontravam por motivos profissionais.
Aos poucos, a tecnologia tornou-se uma realidade na vida de quase todas as pessoas, aproximando-as, mas também as expondo a graves riscos. É neste âmbito que encontramos a genialidade de Carlo Acutis. E quando falamos de genialidade, não usamos palavras nossas, mas do Papa Francisco: «Recordo-te a boa notícia que nos deu a manhã da Ressurreição, ou seja, que, em todas as situações escuras ou dolorosas mencionadas, há uma via de saída. Por exemplo, é verdade que o mundo digital pode expor-te ao risco de te fechares em ti mesmo, de isolamento ou do prazer vazio. Mas não esqueças a existência de jovens que, também nestas áreas, são criativos e às vezes geniais. É o caso do jovem Carlo Acutis» (Christus vivit, n.º 104). Carlo não só percebeu que a tecnologia podia não ser má, mas que podia ser algo muito bom para levar a palavra de Deus a muitas pessoas. No entanto, só pode viver isto porque não estava sozinho. Estava profundamente unido a Jesus.
Carlo experimentou como a sociedade que se transforma rapidamente necessita ser evangelizada. A este respeito, é muito sugestiva a imagem que usa o Papa Bento XVI na sua mensagem para o Dia Mundial das Comunicações Sociais de 2009, quando se dirige especialmente aos jovens: «Quero concluir esta mensagem dirigindo-me especialmente aos jovens católicos, para os exortar a levarem para o mundo digital o testemunho da sua fé. Caríssimos, senti-vos comprometidos a introduzir na cultura deste novo ambiente comunicador e informativo os valores sobre os quais assenta a vossa vida. Nos primeiros tempos da Igreja, os Apóstolos e os seus discípulos levaram a Boa Nova de Jesus ao mundo greco-romano: como então a evangelização, para ser frutuosa, requereu uma atenta compreensão da cultura e dos costumes daqueles povos pagãos com o intuito de tocar as suas mentes e corações, assim agora o anúncio de Cristo no mundo das novas tecnologias supõe um conhecimento profundo das mesmas para se chegar a uma sua conveniente utilização. A vós, jovens, que vos encontrais quase espontaneamente em sintonia com estes novos meios de comunicação, compete de modo particular a tarefa da evangelização deste “continente digital”. Sabei assumir com entusiasmo o anúncio do Evangelho aos da vossa idade! Conheceis os seus medos e as suas esperanças, os seus entusiasmos e as suas desilusões: o dom mais precioso que lhes podeis oferecer é partilhar com eles a “boa nova” de um Deus que Se fez homem, sofreu, morreu e ressuscitou para salvar a humanidade. O coração humano anseia por um mundo onde reine o amor, onde os dons sejam compartilhados, onde se construa a unidade, onde a liberdade encontre o seu significado na verdade e onde a identidade de cada um se realize numa respeitosa comunhão. A estas expectativas pode dar resposta a fé: sede os seus arautos!». Como ao longo dos séculos muitos missionários partiram a evangelizar, hoje cada um de nós é chamado a partir, também, e a evangelizar o «continente digital» que são os novos meios de comunicação. Hoje, como fez o Carlo, devemos difundir a mensagem de Cristo nas plataformas digitais, para que a alegria da fé e da ressurreição de Cristo cheguem ao maior número de pessoas. Partimos em missão, chamados a ser discípulos missionários, como constantemente nos tem apelado o Papa Francisco. Não “discípulos e missionários”, mas discípulos missionários, porque a alegria e a força de participar da vida da Graça de Deus impele-nos a difundir no mundo a Boa Nova da Salvação.
Carlo viveu este projeto de vida não só em relação à informática, mas em todos os âmbitos da sua vida, da escola ao grupo de amigos, da família até àquelas pessoas de quem se procurava aproximar para conduzir a Jesus. No entanto, a prova máxima por que passou Carlo foi o momento da doença. A leucemia fulminante, que ceifou uma vida tão jovem e tão promissora, podia ser vista como algo terrível. No entanto, porque Carlo estava profundamente unido a Jesus, soube oferecer da melhor forma esse mesmo sofrimento. «Pela Igreja e pelo Papa», como ele próprio confidenciou, porque sabe que o sofrimento vivido com amor tem um valor imenso na presença de Deus. O seu exemplo é, por isso, marcante para os nossos dias. Quando vivemos numa sociedade do “bem-estar”, em que cada um se pode fechar para procurar apenas uma vida prazerosa, Carlo ensina-nos como todas as circunstâncias da nossa vida podem ser colocadas ao serviço do bem maior, ou seja, Deus, que é a nossa verdadeira e única riqueza. Ensina-nos que o sentido da vida se encontra não quando perguntamos “Quem sou eu?”, mas quando perguntamos “Para quem sou eu?”, ou seja, quando procuramos no nosso dia-a-dia servir Deus, estar disponíveis para servir o outro, quando não só damos “alguma coisa”, mas quando nos damos a nós próprios. Foi assim que Carlo viveu.
Quero terminar este breve artigo com uma reflexão final, a respeito da frase-mote: «Estar sempre unido a Jesus, este é o meu projeto de vida». Qual foi a forma mais perfeita de Carlo a viver? Não tenho dúvidas em afirmar que foi na Eucaristia. Ele que dizia que a Eucaristia era a sua autoestrada para o Céu, experimentou verdadeiramente que assim era, não porque subisse para o Céu sozinho, mas porque na Eucaristia estava profundamente unido a Jesus. E também este deve ser o projeto de vida para nós. Quando vamos à Missa e especialmente quando comungamos, não estamos a receber uma “coisa”, mas comungamos uma Pessoa, a Pessoa de Jesus Cristo, vivo e ressuscitado, presente sacramentalmente. Assim participamos da Sua vida, da Sua graça, da Sua missão. Deste modo, se queremos estar unidos a Jesus e se queremos que esse seja o nosso projeto de vida, então sabemos que devemos passar também pelas mesmas peripécias da vida de Cristo, de tal forma que, amando e carregando a cruz, sejamos participantes da Sua glória. Viver a Eucaristia pode ser, assim, uma forte renovação da nossa vida: descobrimos o verdadeiro sentido da nossa existência. Não vivemos já para as coisas do mundo, para uma vida que se resume aos bens materiais e para as realidades que se veem e que se tocam, mas passamos a viver num novo grau de realidade, em que o mundo invisível não só existe, mas é crucial, e transforma a nossa existência aqui na terra. Disso é exemplo e modelo Carlo Acutis, e com ele e como ele, podemos aprender a deixar que a graça de Deus transforme a nossa vida.
Padre Ricardo Figueiredo
Diocese de Lisboa
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