Juliana Xavier testemunha sua experiência com a adoção
No tempo do namoro, meu marido e eu planejávamos ter muitos filhos e ser uma família feliz. Arriscávamos falar em seis filhos, pois percebíamos como era bom, por experiência própria, trazer em nossa memória as lembranças das brincadeiras da infância, com os irmãos e primos, e o quanto essa convivência foi saudável e importante na construção de quem somos hoje.
Casamo-nos e passamos o primeiro ano de casados na expectativa da chegada dos filhos. A cada mês, uma frustração e mais uma espera. Como a gravidez não veio, começamos a fazer alguns exames específicos, solicitados pelos médicos. Foi então que descobrimos que a chance de eu engravidar era pequena, que seria necessário continuarmos tentando e, um dia, a gravidez poderia acontecer.
Os anos foram se passando, e nada! Começamos a rezar e Deus começou a falar connosco. Nosso coração foi, aos poucos, abrindo-se à realidade da adoção. Certa vez, padre Paulo Ricardo, em uma palestra da qual estávamos participando, disse: “Se você quer fazer algo para mudar o mundo, não levante bandeiras, não faça barulho por aí, mas diminua o mal no mundo, por exemplo, adotando uma criança”. Confesso que isso mexeu comigo.
Depois, lendo sobre Madre Teresa de Calcutá, descobri que ela orientava mulheres, decididas a abortar, para que não abortassem. Dava-lhes o apoio necessário para terem seus filhos, ao mesmo tempo que ia conversar com casais que não podiam ter filhos, para que optassem pela adoção daquela criança que estava para nascer.
Abertura à adoção
Após esses e outros fatos, fomos nos enchendo da certeza de que, pela adoção, poderíamos ser pais não só de um ou dois filhos, mas de quantos Deus nos enviasse, a seu tempo. Começamos a enxergar a adoção como uma bênção. Demos, então, os passos necessários e entramos no Cadastro Nacional de Adoção.
Neste tempo, participamos de um curso obrigatório, no Fórum, onde alguns profissionais nos apresentaram depoimentos de famílias que adotaram crianças pequenas, grandes e até adolescentes, em que a adoção deu certo, pois as crianças sentiram-se amadas como filhos em suas novas famílias. Essas famílias nos deixaram bem claro que as crianças só precisam ser amadas. Não é de dinheiro, roupa, carro nem casa bonita que eles necessitam, mas de amor.
Enfatizaram que existem muitas crianças maiores de oito anos nos abrigos, precisando de um lar. No entanto, estas não são solicitadas para adoção por preconceito e medo de que não dê certo a adoção de crianças maiores. Segundo eles, muitos casais ficam muitos anos na fila de adoção à espera de um bebê, ao mesmo tempo que essas crianças ficam nos abrigos até a maioridade; depois, voltam para suas famílias, voltando à situação de risco e pobreza.
Amor
Disseram-nos, no curso, que a adoção tardia tem tudo para dar certo, desde que as crianças se sintam verdadeiros filhos amados e desejados pelo casal. Saímos desse curso compreendendo que o casal que deseja adotar deve estar preparado para, mais do que tudo, amar essas crianças ou adolescentes. Amar, colocando-se no lugar da criança, compreendendo-a, orientando, perdoando e doando-se a cada dia.
Alguns meses se passaram e meu marido foi, a trabalho, a uma outra cidade. Lá, ele ficou sabendo que, no abrigo local, havia dois irmãos disponíveis para adoção: uma menina de doze anos e um menino de oito. Então, ele foi até o Fórum dessa cidade, falou com a assistente social, que pegou seu número de celular e ficou de ligar para marcar um atendimento.
Mão de Deus
Ele chegou de viagem empolgado e bastante feliz, contando-me tudo. Eu disse a ele que não haveria chance alguma de adotarmos criança com mais de seis anos, pois essa era a idade máxima que eu pensava ter condições de adotarmos. Meu marido, no entanto, insistiu para que, ao menos, aguardássemos a ligação da assistente e fôssemos ao Fórum quando ela nos chamasse. Concordei com ele, na condição de apenas falarmos com a assistente e nada mais.
Recebemos a ligação. A data marcada foi dia 2 de outubro, dia do Anjo da Guarda. Isso me deixou encucada. Fomos e, na conversa, a assistente só elogiava os dois irmãos. Então, fomos fazendo várias perguntas, entre elas: “Se essas crianças são tão boas, por que estão até hoje no abrigo?” Ela respondeu: “Porque ninguém nem chega a se interessar por elas”. Eu comecei a querer conhecê-los, porque, além de boas crianças, eram, segundo a assistente, bonitas.
Perguntei se ela tinha fotos. Não tinha. Mas ela disse que poderíamos conhecer a menina, pois estava em um projeto social da prefeitura, que eles tinham acesso a entrar e nos levar. Concordamos.
O encontro
Ao entrarmos onde ela estava, quando a vi, no mesmo instante em que a olhei, pela primeira vez, senti no coração: “É a minha filha que está aqui diante de mim. Como vou embora e deixá-la aqui, longe de mim, sem eu poder cuidar?”. Ficamos ali por pouco tempo, sem poder deixá-la perceber nada. Fomos embora, totalmente mudados, principalmente eu.
No mesmo dia, à noite, tive de ir à faculdade e meu marido foi à Missa. Ao deparar-se com o Evangelho do dia, em que Jesus dizia: “Quem recebe a um desses pequeninos, é a mim que recebe”, ele não pôde conter as lágrimas: aí estava mais um sinal para nós.
Voltamos à cidade 20 dias depois, na data marcada pelo Fórum. Era dia 22 de outubro, dia de São João Paulo II, a quem, anos atrás, em nossa lua de mel, havíamos consagrado os filhos que Deus nos fosse dar. Outro sinal. Neste dia, conhecemos o menino, lindo! A partir de então, passamos a visitá-los com certa frequência, para passear com eles. Até que recebemos a ligação do Fórum, com a notícia de que poderíamos falar com eles da adoção e poderíamos levá-los para a guarda provisória.
A adoção
Desde então, passamos por um tempo de adaptação. Hoje, dois anos e meio depois, já pais definitivos, podemos dizer que somos uma família feliz, normal como qualquer outra, e que nossos filhos são muito amados e alegram, a cada dia, o nosso lar com muitos sorrisos.
Em toda nossa história, o mais belo é poder ter acolhido a vontade de Deus para nós, com alegria e confiança. Nem sempre ela coincidiu com o que sonhamos, mas, certamente, foi e é bem melhor que nossos sonhos!
Juliana Xavier, missionária da Comunidade Canção Nova
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