“Quem sou eu?”, a pergunta que, mesmo que não admitindo, nos assola o pensamento, de vez em quando. A nossa identidade está sempre em construção, existem períodos críticos onde solidificamos as bases, mas nunca está terminada.
A adolescência é o período onde esta pergunta salta, constantemente, à nossa mente. Com muita frequência, fazemos esta pergunta a nós mesmos, seja em momentos de reflexão pessoal, seja depois de um comportamento que estranhamos em nós, ou, ainda, quando nos comparamos a colegas e tentamos perceber o que temos de especial. Pensamos muito sobre este tema, pois estamos no processo de construção da nossa identidade. As amizades e todas as interações sociais (positivas ou negativas) vão ajudar-nos a perceber as nossas qualidades e defeitos, vão conduzir-nos à reflexão das atitudes dos outros, o efeito que têm em nós e, seja por imitação ou aprendizagem, iremos replicar as que consideramos acertadas (ou desejadas por nós).
Entretanto, tentamos descobrir quem somos, para além das nossas caraterísticas queremos saber os nossos limites, o que o nosso corpo aguenta, até onde podemos/conseguimos ir, quais os limites da sociedade e se eu os quebrar, o que acontece? E como me sinto no meu limite? A adrenalina que percorre o nosso corpo dá-nos ânimo e vontade de avançar mais um pouco.
Vamos crescendo, tornamo-nos adultos e o assunto fica “arrumado”. Não pensamos mais nesta pergunta, pois estamos ocupados em arranjar um emprego, ou na procura da “alma gémea”, ou a cuidar dos filhos e da casa, ou a cuidar dos pais. Contudo, é uma questão que devemos retomar ao longo da nossa vida, com o intuito de nos percecionarmos e posicionarmos. O caminho do autoconhecimento não é fácil, mas é encantador, revelador e orientador.
“É absolutamente indispensável uma auto-identidade sólida e substancialmente positiva.” Amedeo Cencini (Amarás o Senhor teu Deus, 1998). Preciso saber quem sou, conhecer o meu valor e o que faço de melhor (qual o meu papel), sem isto a vida parece que não flui, que não tem sentido.
Acompanhei uma jovem muito tímida, com imensa dificuldade em falar, sem sentido na vida, nem no seu trabalho, com alguns pensamentos de suicídio, sempre com a ideia “não consigo”, perante as tarefas a realizar e nos relacionamentos interpessoais, era apagada, não dava opinião, silenciava. Nas consultas, fomos trabalhando o auto-conhecimento com muita dificuldade, ela não conseguia ver nada bom em si, não reconhecia qualquer valor, não sabia dizer em que era boa ou que gostava de fazer. Questionei-a sobre o seu diálogo interno, isto é o que ela dizia a si mesma ao longo dia, que pensamentos/sentimentos/ideias lhe iam surgindo no meio das suas actividades, o que sentia, que emoções lhe iam surgindo e ela olhou para mim muito espantada e respondeu “Eu acho que não faço isso”. Então, pedi para fazer o exercício de pensar ao longo do dia nas emoções/sentimentos que vai tendo à medida que vai realizando as suas tarefas e que reação tem. Na semana seguinte, apareceu com um grande sorriso e muito admirada, porque descobriu o seu “diálogo interno” e isso ajudou-a a tomar consciência de si mesma, do seu autodomínio e, do que em logoterapia chamamos, autodistanciamento (capacidade de pensar sobre si e as suas reações), deu consigo a pensar “lá estás tu a dizer que não consegues”.
Esta descoberta, trouxe-lhe, para além do conhecimento de si mesma, um poder que ela desconhecia, de domínio de si, o que a levou à descoberta da liberdade interior. Desde esse momento de descoberta, parece que se abriu um arco-íris de emoções, num paraíso encantado desconhecido, dentro de si. Tomou consciência de como se sentia ao longo do dia, o que os outros a faziam sentir e conseguiu começar a interagir com os outros, verbalizar os seus sentimentos, até conseguiu começar a dar opiniões (antes era impensável) e a ler em público! O trabalho começou a fazer-lhe sentido, as suas atividades deixaram de ser monótonas, repetitivas para adquirem um sentido superior de ajuda ao outro (em logoterapia falamos de autotranscendência).
Quando sei quem sou, encontro-me comigo mesmo, conheço os meus pontos fortes e fracos, tenho noção e reconheço o meu valor, aceito a minha história, sei o que quero (para onde caminho) então tudo adquire outro sentido. Vale a pena investir na descoberta de mim mesmo.
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