Esta semana, retirei da capa do meu telemóvel, um pequeno bilhete com uma citação do Papa Francisco, que já há alguns meses permanecia lá. Na realidade, já nem me lembrava o porquê de ter guardado aquele papel na capa do telemóvel, mas bastou-me reler a citação para perceber a sua importância e profundidade.
O papel continha o seguinte texto: “Os jovens são a esperança de um povo. Isto ouvimo-lo dizer por todos os lados. Mas, que é a esperança? É ser otimista? Não. O otimismo é um estado de espírito. Amanhã acordas com dor de fígado e não és otimista, vês tudo negro. A esperança é algo mais. A esperança é sofrida. A esperança sabe sofrer para levar a cabo um projeto, sabe sacrificar-se. Tu és capaz de te sacrificar por um futuro, ou queres apenas viver o presente e quem vier depois que se arranje? A esperança é fecunda. A esperança dá vida. Tu és capaz de dar vida, ou vais ser um jovem ou uma jovem espiritualmente estéril, sem capacidade de criar grandeza? A esperança é fecunda. A esperança empenha-se no trabalho.”
Quantos pensamentos, quantas interrogações me pus ao ler este breve texto, retirado do discurso do Papa Francisco aos jovens, na visita a Cuba e aos EUA. Mas, tentava, sobretudo, relê-la a partir do contexto em que vivemos…
Com esta pandemia que nos atinge, muitas são as interrogações que nos surgem: “Onde está Deus perante tudo isto? Onde poderá residir a esperança de futuro, quando num abrir e fechar de olhos tudo se torna incerto graças a algo minúsculo?”
Perante estas interrogações, muitas foram as respostas otimistas que surgiram. Foram muitos aqueles que tentaram relativizar, e afirmaram que “vai ficar tudo bem”. Mas, na realidade, sabemos e compreendemos, cada vez melhor, que não vai ficar tudo bem. São muitas as pessoas que morreram de forma inesperada, muitos aqueles que perderam o emprego, muitos os que entraram em depressão por não aguentarem a solidão de estar confinados a quatro paredes. Para além disso, vemos as dificuldades de convivência das famílias, com o número de denúncias de casos de violência doméstica, e a violência a menores a aumentar… A resposta otimista de que “vai ficar tudo bem” parece ter-se esfumado, tendo servido para alimentar, por algum tempo, este “estado de espírito otimista”.
Continuam a faltar respostas que possam dizer aos jovens, não que “vai ficar tudo bem”, mas que, com algum (ou bastante) sacrifício, poderemos, aos poucos, regressar à normalidade. E, é nesse sacrifício, que poderá estar escondida a verdadeira esperança, a dizer-nos que não há nada mais importante que sacrificar-se para poder salvar vidas. Estar em casa, manter a distância dos outros é, sem dúvida, um sacrifício, mas ninguém se sujeitaria a isso, se não sentisse que vale a pena para cuidar da sua vida e da vida de outros.
No meio de uma cultura de descarte (expressão usada pelo Papa no seguimento do mesmo discurso), parece que a verdadeira esperança pode estar numa humanidade que, em alguns meses, percebeu que, afinal, a vida não é descartável, que podemos e devemos lutar por ela até às últimas consequências.
Dizia-me um professor que, se o sinónimo do amor é “dar vida”, o antónimo será “querer possuir e dominar a vida”. Não precisamos de nos esforçar muito, para ver o quanto o ser humano tem lutado por esta tentativa de possuir e dominar a vida. Através do avanço da ciência e da tecnologia, avança a defesa da ideia que uma vida onde o sacrifício supera o otimismo, não merece ser vivida. É neste contexto, que este vírus surge para nos obrigar a pensar ao contrário: retirou-nos o otimismo, mas deu-nos a esperança de uma humanidade que, com sacrifício, luta por preservar a vida!
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