12 AGOSTO | A peregrinação é uma oportunidade de transfiguração afirma D. José Traquina

Irmãos e irmãs migrantes: portugueses ou de outras nacionalidades, peregrinos que viestes individualmente, em família ou em grupo organizado, que esta vossa vinda ao Santuário de Fátima seja retemperadora da força e da luz interior da Fé.

A peregrinação, o encontro consolador com a Imagem de Nossa Senhora, a oração e as celebrações em que participamos, ajudam-nos a valorizar a vida e o seu sentido. O tempo que gastamos em peregrinação é uma oportunidade que damos a Deus para nos agraciar, inspirar e dar sentido de bênção a todo aquele tempo que ocupamos com trabalhos e dedicações diversas. Isto é, a peregrinação é uma oportunidade de transfiguração.

1- A vida humana; o dom e o maior bem valorizado em tempos difíceis.
Nos últimos meses, marcados pela pandemia, foi ressaltado o valor da vida humana: nos doentes, idosos, pessoas com deficiência ou necessidades especiais. Tem sido edificante o testemunho de tantos profissionais e voluntários cuidadores nas mais diversas circunstâncias e necessidades das pessoas. Para os migrantes houve dificuldades acrescidas; os portugueses que não puderam regressar ou sair de Portugal, os que foram atingidos pelo vírus, os que ficaram desempregados e os que experimentam a fragilidade e a acentuada insegurança por viverem num país estrangeiro. Entretanto, de Cabo Delgado, em Moçambique, a Organização Internacional das Migrações dá-nos conta de que existem mais de 250 mil pessoas deslocadas. Não admira, portanto, que seja naquela região de Moçambique que se encontra a maior densidade de pessoas atingidas pelo coronavírus naquele país. De Portugal já foram promovidas diversas iniciativas de apoio, mas a necessidade é grande. Porém, é urgente que seja encontrada uma solução para travar os combates armados que atingem pessoas inocentes. Em África ou em qualquer parte do mundo, é necessário considerar a pessoa humana como o centro, o valor e o bem maior a acolher, defender e promover, para que haja humanização e desenvolvimento social.

2- A fonte da vida espiritual dos cristãos
Como nos ensina a Sagrada Escritura, a pessoa humana é criada à imagem e semelhança de Deus (cf. Gen 1,26). A confirmar esta consideração por cada pessoa, está a Leitura que ouvimos do livro do Deuteronómio na defesa das pessoas pobres: Deixa para o estrangeiro, o órfão e a viúva o que ficou para trás: o feixe das espigas e o que ficou nas oliveiras quando as varejares ou o que ficou nas videiras quando vindimares (Deut 24, 17-22).

Este ensinamento da Palavra de Deus lembra-nos que há uma parte dos nossos bens que devem ser disponibilizados para quem deles carece. Mais do que o apelo a uma generosidade pontual ou continuada, trata-se de reconhecer a nível mundial o direito dos pobres. Deus quer que seja reconhecido o direito dos pobres no mundo inteiro.

Para gerarmos maior disponibilidade e generosidade, a melhor atitude é considerarmo-nos pobres. Pobres, necessitados da graça e do auxílio de Deus, como cantávamos no salmo responsorial, vivendo em confiança e generosidade.

Jesus é a nossa referência: nasceu e viveu pobre; na sinagoga de Nazaré, lendo o Profeta Isaías (Lc 4,16-24), definiu a sua missão assumindo que o Espírito estava com Ele para anunciar a Boa Nova aos pobres. Porém, a pobreza em Jesus não foi uma condição social, foi virtude, uma opção. Jesus tinha capacidade para ser um grande líder, mas preferiu ser um Bom Pastor. E é por isso que exprime confiança, liberdade interior e dimensão profética. Jesus atrai os pobres; o seu coração tem o tamanho de um grande santuário onde todos cabem. Chamou os discípulos a segui-Lo no mesmo estilo e enviou-os em missão, desprovidos de bens materiais. No Evangelho proclamado, do capítulo 25 de São Mateus (25,31-46), Jesus revelando o critério do juízo final, define qual deve ser a atuação de todos os cristãos, para que haja uma nova humanidade. “Vinde benditos de meu Pai: recebei como herança o reino. (…).

Quantas vezes fizestes o bem a um dos meus irmãos mais pequeninos foi a Mim que o fizestes”. Jesus identifica-se com os mais pequeninos; os pobres, os carenciados, os migrantes desprotegidos, todos os que vivem privados do essencial. E identifica-se, também, com aqueles que têm abundância de bens materiais, mas têm coração de pobre e, por isso, promovem a partilha com os que carecem de apoio.

3- A responsabilidade de testemunhar
Irmãos e irmãs Com a coordenação da Obra Católica Portuguesa de Migrações, de 09 a 16 de agosto, está a decorrer 48ª Semana Nacional das Migrações que tem o seu auge nesta Peregrinação ao Santuário de Fátima, e tem como tema aquele que o Papa Francisco anunciou no passado dia 13 de maio para o Dia Mundial do Migrante e Refugiado: “Forçados, como Jesus Cristo, a fugir. Acolher, proteger, promover e integrar os deslocados internos”.

A Obra Católica Portuguesa de Migrações espera mais envolvimento dos Serviços Diocesanos com os migrantes. É desejável que os Secretariados Diocesanos para as Migrações desenvolvam iniciativas que tenham a ver com os migrantes portugueses no estrangeiro e também com os migrantes estrangeiros residentes em Portugal que, segundo um recente Relatório do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, ultrapassa as 590 mil pessoas. Esta é uma realidade para a qual a Pastoral da Igreja tem de estar atenta para acompanhamento e apoio.

Como cristãos, manifestemos capacidade de acolhimento e não cultivemos sentimentos que não correspondem à nossa matriz cristã de fraternidade universal. Os estrangeiros são uma necessidade e um bem para Portugal, não para serem explorados ou mal tratados, mas acolhidos e protegidos com a mesma respeitabilidade que desejamos para os portugueses que vivem em qualquer outro país. Devem ser informados acerca das nossas regras e hábitos de convivência e ter as condições para expressarem a sua cultura.

4- “Dar Graças por viver em Deus”
Caros peregrinos, o Santuário de Fátima definiu, para este ano, o tema: “Dar Graças por viver em Deus”. “Viver em Deus” deve corresponder a viver com entusiasmo e alegria. Foi a grande experiência de Nossa Senhora: exultou de alegria porque “o Senhor olhou para a sua humilde Serva”. Aqui, na Cova da Iria, Nossa Senhora, em tempo de guerra, apareceu aos três pastorinhos, três crianças pobres, e deu-lhes uma missão que eles assumiram com alegria: fidelidade na oração e esforço pessoal pela conversão dos homens e pela paz no mundo. A missão dos Pastorinhos mostra que viver em Deus implica interesse e zelo pela humanidade. Concretizando o Evangelho, esta é a missão que nos é confiada, sabendo que o futuro do mundo depende da conversão dos homens, na resposta ao problema dos pobres e à defesa do planeta Terra.

D. José Traquina